Monday, July 29, 2013

Crónica Rosário Breve Malhar no linho por Daniel Abrunheiro

É com uma espécie de estupor sereno que confiro a terraplanagem da existência, mercê duvidosa dos anos compressores. A uma banca de Café de bairro, não se me estraga a vocação de viajante sentado, mais atento à fábrica de imagens com que por dentro giro e digiro a luz do mundo do que à orwelliana suinicultura em que o meu (e teu) descoroçoado País se degradou.
Vindo e indo de temperada moderação (e modulação) o corrente Estio, chega a ser gratificante apontar os óculos aos enigmas simples disso a que à falta de melhor palavra chamamos Realidade. Cuida, ó Leitor(a), que se não trata, por parte minha, de uma passividade mas sim de um alternativo malhar no linho, por assim dizer. Tu e eu, para bem mal nosso, sabemos que à desPolítica não há que dar confiança – há que dar palha, por ser burra. Só que, enquanto de todo me não vibrar través a nuca o cutelo da hora última, todo o instante me será primeiro – pois que cada novo dia ou é renascimento ou não é dia nem novo.
Em menino, eu não temia o futuro. Naturalmente não, posto que cada criança é o futuro mesmo feito corpo. Só se envelhece quando se passa a temê-lo. Nos entrementes, porém, como a gente sabe, os anos a tudo terraplanam. Outra conjunção adversativa, ainda assim, saibamos opor a tal “porém”: todavia. Assim: todavia, subir em idade (para descer a/o tempo) não é tudo amargor. À infecta fauna do regime “cagarro” de nossos tristes dias, o alegre e comovente e comovido momento contraponho, esse de quando, a casa volvendo, me dou de rosto com a taça de fruta fresca que a minha Senhora pôs a presidir à camilha antiga e limpa que a Avó dela lhe transmitiu. Como jóias vivas, os frutos dão de si a colorida água-forte & a substanciação do açúcar. Por outro mais simples lado: são pêras.
A visão é mais-que-perfeita como um pretérito longe feito perto hoje, não todavia suficiente para me fazer esquecer, ante todo este espúrio e estupefaciente carnaval de crocodilas lágrimas antecipadas pró-pré-morte de Nelson Mandela, que em 1987 (há meros 26 anos, portanto), reunida a Assembleia Geral das Nações (alegadamente) Unidas, ia a moção plenária um apelo à libertação incondicional desse gigante sul-africano. Votaram a favor 129 países. Três votaram contra: os EUA, então tragicomicamente rendidos ao Reagan, a Grã-Bretanha, da Thatcher, e um tal Portugal dum tal… Cavaco.
Nem quem viola é preso, nem quem é violado esquece. A nossa amnésia carneirinho-multitudinária persiste em procrastinar (isto é, adiar; isto é, odiar) o evidente. E o evidente é a quinta de porcos do velho Orwell, que a tudo e todos, filósofos de Café de bairro incluídos, pretende terr’arrasar.

Por meu linho, que à camilha da minha Senhora dá corpo como outrora o futuro corpo deu à minha infância, que o não permitirei sem luta. Nem sem pêras, dessas doces e de anatomia tão similar ao violino e, já agora, à minha Senhora também. 

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